As Janelas Que Se Fechavam Sozinhas
Era uma vez uma menina que vivia numa casa cheia de janelas.
Cada janela dava para um pedaço do mundo: um campo dourado ao entardecer, um rio preguiçoso, uma estrada que sumia no horizonte.
Todas as manhãs, ela abria cada uma com cuidado, querendo ver o dia nascer por todos os ângulos.
E então, sem que percebesse, algumas janelas começavam a fechar sozinhas.
Não eram as janelas mais bonitas. Eram as que davam para o mato fechado, para as tempestades, para o lobo que, às vezes, rondava a floresta.
A menina começou a notar que, por mais que houvesse luz do outro lado, seus olhos teimavam em buscar as frestas escuras.
Era como se algo dentro dela dissesse: "Olhe o perigo. Cuide-se. Prepare-se."
Com o tempo, ela já nem se interessava mais abrir as janelas boas.
Seu corpo corria até as janelas trancadas, suas mãos tocavam o vidro gelado, sua respiração se prendia.
Ela não sabia, mas sua mente, aquela poderosa guardiã ancestral, havia sido treinada para isso: detectar o que ameaça, ignorar o que conforta.
Era biologia pura — sobrevivência.
Era história coletiva — herança dos que caminharam antes dela, temendo feras, trovões e outros perigos ocultos.
Era filosofia — a consciência de que a vida é tão breve quanto bela.
Mas, um dia, cansada de ver apenas a escuridão, a menina fez algo diferente:
Sentou-se diante de uma janela aberta, de frente para o campo, e esperou.
No começo, sua mente gritava: "E se algo ruim vier pelo campo? E se o céu escurecer de repente?"
Mas ela respirou fundo. Deixou o vento bagunçar seus cabelos.
Deixou a luz dourada pintar seu rosto.
E percebeu, em silêncio, que não há bravura maior do que escolher ver a beleza, mesmo sabendo que a tempestade pode chegar.
A partir daquele dia, ela continuou abrindo todas as janelas.
Mas aprendeu a não deixar o medo escolher para onde olhar.
E talvez seja isso que todos nós estamos tentando fazer, todos os dias, sem nem perceber:
Reaprender a ver o mundo inteiro, e parar de viver com medo.
Essa história ensina que o medo é automático, mas a apreciação da vida é uma escolha consciente.
E é essa escolha que define se vamos viver presos às janelas fechadas ou abertos para tudo o que o mundo ainda pode oferecer.
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